quarta-feira, 28 de julho de 2010

Whiskynho de Papai

Papai sempre foi bom de copo. Algumas histórias eu escutei e outras vivenciei. Ele contava que quando solteiro, sentava em um bar na Frei Mariano, quase esquina com a avenida, se não me falha a memória se chamava America, e começava a beber com os amigos. Ia descendo cerveja e a organização do bar era de não tirar as garrafas para poder contá-las no final e efetuar a cobrança. Quando enchia a mesa, era colocado um engradado no chão e passavam para ele as garrafas vazias. A brincadeira era ver quem levantava por último para ir ao banheiro, e o ganhador não participava do rateio da conta. Sempre quem ganhava era o Mateba . Muito tempo depois que foram descobrir que ele urinava sentado, sem ninguém perceber, e dentro das garrafas. E descobriram da pior maneira. Achando que tinham colocado cerveja cheia dentro do engradado e como já estava quente, para não desperdiçar os copos foram preenchidos com o mijo do Matebão. Quando sentiram o gosto diferente, ele, que não tinha visto o companheiro completando os copos com "aquela" garrafa, adivinhou e falou que era sua urina. Quando quiseram bater nele, ele se defendeu dizendo que os companheiros não sabiam perder, pois a aposta era de quem era o último a levantar e não o último a mijar.
Muito tempo depois, papai já com 85 anos e sempre tomando seu Whiskynho, começou a deixar Mamãe preocupada. Falava que ele estava bebendo muito e que tínhamos que conversar com ele. Quando fui falar, ele me garantiu que tomava só duas doses e de dois dedinhos cada, antes de cada refeição. Acreditei nele e fiquei achando que Mamãe estava exagerando até o dia em que descobri o problema. Mamãe não estava exagerando e ele estava falando a verdade, o problema era de memória. Ele tomava a terceira, quarta e quinta, sempre achando que era a segunda. Quando falei isso para ele, que estava esquecendo e já devia ser efeito do álcool, só faltou me bater. Aí completei dizendo para ele fazer uma marca na garrafa e colocar a data. Para minha surpresa ele disse:
- Seu sabichão (ele falava isso sempre que estava puto comigo), eu já fiz isso.
- E aí pai, o que descobriu?
- O pior. Descobri que a Ana esta bebendo do meu whisky. Eu sirvo e ela serve junto.
Não acreditei no que estava ouvindo. A Ana era de confiança de Mamãe e nunca iria fazer isso. Não tinha jeito, ele iria sempre achar uma desculpa para tomar todas.
Aí a minha irmã teve uma idéia brilhante. Compraríamos o whisky dele e preencheríamos a metade com água. Então começou a operação, que batizamos de Paraguaia. Com uma agulha de tirar sangue de cavalo aquecida, furávamos o conta gotas de uma garrafa vazia e preenchíamos com 70% de whisky e 30% de água mineral. Com o tempo fomos mudando a proporção até chegar a meio a meio. Ele não percebia nada e com isso de duas garrafas por semana, esse era o consumo dele, passou para uma.
Chegávamos a fazer a multiplicação dos whisky de caixa. Sempre tinha um filho ou nora ajudando. Tinha caixas de whisky preparadas em minha casa. O incrível é como ele não percebia mesmo sendo um bebedor experiente e conhecedor. Ele identificava a marca só no paladar. Como Mamãe continuou pegando no pé dele, um belo dia ele falou para ela:
- Pronto, tomei uma decisão junto com essa última dose de whisky. Foi a última da minha vida.
E não bebeu nunca mais. Com o cigarro foi a mesma coisa. Ele fumou um cigarro continental sem filtro e também falou, "foi o último", para nunca mais fumar. Esse era papai, nunca vi ninguém de mais opinião do que ele.
Tenho muitas saudades.

Um comentário:

  1. Era a maior caracterista dele. DETERMINAÇãO.
    Eu tb tenho muitas saudades!!!!!

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