Vaca não morde

Essa é muito recente, aconteceu mês passado. As fazendas de pasto plantado são todas abastecidas com água do subsolo. O sistema é todo automático. Tem poços semi artesiano com profundidades variando de 40 até 200 m perfurado em rocha. No fundo bem abaixo do seu nível dinâmico é montado uma bomba elétrica de múltiplo estágio que recalca essa água até uma caixa que fica a 12 m de altura e por gravidade abastece as pilhetas onde o gado bebe. Essas caixas de água, que chamamos de taças pelo seu formato, são metálicas e devido a qualidade da água e a má qualidade das pinturas não duram mais do que 10 anos, quando começam a apresentar vazamentos. Conversando com meu filho Guilherme que é o responsável pela área de engorda e com o Beto, que é o diretor da Ema, tivemos a ideia de fazer uma torre de alvenaria. Temos uma fabrica de blocos de concreto e construiríamos uma torre de alvenaria, de 2,00 m de diâmetro, com laje a cada 2,40 m e seria toda construída por dentro, não necessitando de andaimes. As lajes, logicamente, não eram em toda a área. Tinha uma parte de 0,70 m que não seria completa. Após 5 lances construiríamos a caixa d'agua, de alvenaria também.

Fizemos o projeto e escolhemos a equipe. Tinha que ser um pedreiro e dois serventes. Tinha uma velocidade de construção para permitir a cura da argamassa de assentamento. Deveriam ser pessoas que não tivessem medo de altura, pois o respaldo da caixa estaria a 15 m de altura. Deveriam ser responsáveis para trabalharem com cintos de segurança e outras exigências mais. Na seleção das pessoas, com tantas exigências, esquecemos que deviam ser pessoas que conhecessem o campo e mandamos os três marmanjos para lá. No mesmo dia marcamos a obra, o material necessário já estava todo lá e ficamos de voltar no dia seguinte para ver como estava o andamento da obra.

Quando lá chegamos, um dos serventes já estava com as malas prontas para voltar com a gente. Perguntamos o que tinha acontecido. A comida era ruim? Alguém o tinha destratado? Não podia ser a altura pois estávamos na fundação. Foi quando ele disse:

- Nao é nada disso não patrão. É o bode que não gosta de mim.

Não entendi pois não tinha bode na fazenda. Só uma ovelha, a Milene, que nos aniversarios dos netos nós levamos pras festas pra entreter a gurizada. Expliquei pra ele que era mansinha, nem tinha chifre, que ele podia ficar tranquilo. Achando que tinha resolvido o problema, sem rir, fui me despedindo, quando ele voltou a falar:

-Mas “Dotor” e a vaca?

-Que vaca rapaz? Eu já estava ficando preocupado porque os outros dois companheiros estavam prestando a maior atenção sem dar o mais leve sorriso.

-Tem uma vaca que fica o tempo todo me olhando, às vezes até me segue e se eu não corro, ela me morde.

Com as explicações detalhadas eu entendi. Para eles chegarem no local onde estavam construindo a torre, eles passavam pelo rodeio, que é o lugar onde o gado lambe o sal e toma água. Como o capataz era relapso, o gado estava sem sal e quando via alguém seguir para o rodeio achavam que era alguém que colocaria sal no cocho para elas e vinham atrás. Quando eles viam aquelas vacas seguindo eles, desembalavam a correr que nem doidos. Imaginem a cena.

Passei um bom tempo explicando que vaca não morde, chifra e o motivo pelo qual elas o seguiam.

Como diz um amigo meu aqui do pantanal: " Não é fácil..."