segunda-feira, 5 de abril de 2010

Dom Rafael, O pintor

Não tenho certeza se o nome era esse. Podia ser Pablo. O que tenho certeza é que era bem espanhol. Devia ser a década de 50. Ele era um pintor Uruguaio, ou talvez argentino, que veio bater aqui em Corumbá e ele e papai se tornaram grandes amigos. Ele vivia se gabando de já ter pintado muita gente famosa. Entre outras qualidades era um excelente retratista. O gran fino posava para ele e em 7 dias, com uma sessão de uma hora por dia, o cara estava imortalizado em sua tela.

Numa das histórias que papai contava, ele chegava na casa Marinho dizendo que tinha aceitado uma encomenda. Por cem contos de réis ele iria pintar, nada mais nada menos, que o bispo da diocese de Corumbá. Nem imagino quanto dinheiro isso era na época, mas não devia ser pouco pois a bebida da noite já foi ele quem pagou e já por conta. Estava feliz da vida e todos os dias antes e depois das sessões passava no Marinho e papai acompanhava passo a passo ou, pincelada a pincelada, o retrato do bispo. Dom Rafael se gabava o tempo todo dizendo que o bispo estava deveras encantado e que tecia elogios diariamente a ele. Ao invés de 7 sessões a coisa foi se prolongando, devido a chapéu, estola e todos os apetrechos que o bispo muito vaidoso fazia questão de colocar para a pintura, acabou terminando o quadro em 14 dias.

Até o término do quadro Dom Rafael não tinha recebido um puto. Quando terminou, vendo a alegria do bispo ficou aguardando pelo pagamento, mas ele pediu que passase no dia seguite. Como sempre passou no Marinho e falou com papai:

- Dom Alberto, puede ser que el representante máximo de la igreja no vá a me pagar?

Papai correu em tranquilizá-lo:

-De jeito nenhum!

Isso era coisa que nem se podia pensar. No dia seguinte no horário marcado Dom Rafael não encontrou o bispo, só o recado que voltasse no dia seguinte. Dom Rafael foi novamente ao Marinho e papai o tranqüilizou novamente, mas já não foi tão enfático. No quinto dia, papai já perguntou se a pintura tinha realmente ficado boa ao que Dom Rafael respondeu meio bravo:

- Se não ficou, o que está fazendo na parede central da sala do bispo? Certamente que si Dom Marinho!

Depois de muitas semanas de cobrança, um dia Dom Rafael passa todo contente pelo Marinho e mostrando um bolo de notas de reis para papai fala:

- Mire Dom Marinho! “Ayer el conto del vigário e hoy los contos del vigário”.

E se foi todo feliz da vida.

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