quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Corumbá

Corumbá esta na fronteira com a Bolívia no oeste do Brasil, na margem direita do rio Paraguai. O pessoal de fora, para tirar sarro da gente, fala que se o freio falhar nós paramos na Bolívia. Os mais abusados já falam que quem mora aqui são os que moravam lá e mandados para a PQP vieram parar aqui. Mas é tudo inveja, não tem lugar melhor que este para se morar. Falavam que aqui era o fim do Brasil e só depois de velho que vim a saber pelo Dr Alaer, que nem é daqui, que estamos na porta de entrada e não na dos fundos. Os emigrantes que saíram da Europa e para cá vieram, devido a dificuldade de subirem a serra do mar, não existia a São Paulo - Santos, desciam de navio até a Argentina, entravam pelo mar del plata, subiam o rio Paraguai e desembarcavam aqui em Corumbá. Alguns ficavam e outros seguiam para frente ou de barco mesmo para Cuiabá, ou pela Estrada de ferro Noroeste do Brasil, para São Paulo. Meus avós, tanto paternos vindo de Portugal, quanto maternos vindos do Líbano, desceram no primeiro Porto brasileiro, o Porto de Corumbá. Corumbá é uma boa cidade de se morar, mas no passado, muitas coisas eram melhores e deixaram saudades.
Sou da época em que as únicas ruas pavimentadas eram a frei Mariano e a Delamare e com paralelepípedos. A Avenida General Rondon, uma das mais importantes, era de chão batido e nela fazíamos buraco para jogar bolitas. Para diminuir a poeira o pessoal molhava a rua. Uma das imagens antigas que tenho na memória é a de tio Vicente, de pijamas e mangueira na mão, fazendo isso na rua 7 de setembro. A primeira tentativa de asfalto foi na rua 15 de novembro. Houve até inauguração e foi uma alegria ver aquela coisa preta, lisinha e que não fazia poeira. Alegria que durou pouco, pois devido à inclinação da rua e a temperatura de mais de 50 graus sob o sol, aquele piche derreteu todo e começou a escoar rua abaixo.
Os cines Santa Cruz, Tupi e o Anache, eram muito bons e nos proporcionaram momentos inesquecíveis. Sou do tempo que beijo na boca de namorada era só no escurinho do cinema. O nosso clube Corumbaense era palco de muitos bailes de férias, onde todos os namorados aproveitavam para dançar abraçadinhos. Era a única hora em que a rígida sociedade Corumbaense admitia que um rapaz pudesse passar os braços pela cintura de uma moça e ficar de rosto colado com ela na frente de todos. Como era bom. Era a hora das “encochadinhas”, dada as escondidas, que delícia. Hoje é tudo diferente, não tem mais o prazer da sedução, do escondido. É ripa na chulipa direto. Beijo na boca escancarada é na cara escancarada da sociedade.
Não tinha crack, cocaína, maconha. Era cigarro, Cuba Libre e para os mais avançados, no carnaval, uma lança perfume. Casa de prostituição, que nós chamávamos de Bordéu ou Zona, tinha que ter uma lâmpada colorida na porta, para não ter perigo de nenhum incauto inocente entrar naquelas casas de "mulheres da vida", olha como eram classificadas, sem saber. O nosso inicio sexual foi com profissionais, que é como tem que ser as coisas bem feitas. Teve muito treinamento antes, mas os finalmentes...

Aids, Hpv e outro monte de doenças sexualmente transmissíveis, não existiam. O máximo que se podia pegar era uma gonorréia, e chegava até a ser uma alegria para o pai acompanhar o filho ao médico para tratar. Era seu atestado de macho. Lembro-me da minha primeira e fui com papai no Dr. Fadah, que chegou falando:

- Examina o menino aí doutor e explica que ele tem que sossegar com esse pinto novo dele e não ficar colocando em qualquer buraco - Mas isso dito com muito orgulho.

Sexo antes do casamento com a namorada, nem pensar. E quem fazia acabava casando na marra, tinha que reparar o mal que fez à moça. Outros para evitar esse constrangimento, depois do acontecido, já marcavam a data, antes que dessem conta. Tem um caso de um amigo que estava na maternidade esperando a esposa dar a luz ao primeiro filho. Ficou na sala de espera com a sogra e rezando os dois, pois a mulher entrou em trabalho de parto depois de 7 meses de casado, e a velha não tinha dúvidas que era prematuro. Quando veio o médico com a notícia que nasceu tudo bem e de que o bebe pesava quase 4 quilos, ao invés dos parabéns, recebeu uma bolsada nas fuças da sogra, por ter comido a merenda antes do recreio. Quem casava muito rápido, como eu, que em seis meses, namorei, noivei e casei, quando nascia o filho todos faziam contas para ver se cumpria os nove meses. A minha Laura nasceu em 9 de fevereiro de 1974 e eu casei em 7 de abril de 73. Não percam tempo, foi na lua de mel. Mas em dezembro já tinha corrido um boato que Bea tinha tido um filho, era homem, e se chamava Tadeu.
Mas tudo isso faz parte de um passado por demais gostoso, se eu pudesse voltaria para lá.
Para ir às matinês de domingo, trocar gibis e ver Flash Gordom, com seus foguetes futuristas.
Para ir a noite à casa de Tia Dirce com meus pais visitar o vovo Marinho e ficar na rua brincando de "cola pau", "ovo na agulha" e "pegador".
Para escutar a sirene do moinho matogrossense tocando a uma hora da tarde, em ponto, comigo dentro do Sinca Chambord de papai e estacionado no mesmo lugar que ele parou na hora do almoço e eu roubei para dar uma volta.
Para ir no seu Ermínio comprar picolé de coco e comer de trás para frente e não dar o meu finzinho, cheio de coco para meu irmão pidão, Tontonio.
Ficar sentado na porta com a família vendo o movimento e conversando com seu Alexandrino e Dona Linota, nossos bons vizinhos. Não tinha essa televisão que a família fica assistindo o dia inteiro e faz com que você saiba o que acontece no mundo todo e ignore o que está acontecendo a sua volta.
Para ver a Alice com suas covinhas.
Tudo são coisas de meu passado e inesquecíveis.
Mas vou parar de lembrar-me dele, pois estou ficando com os olhos marejados de lágrimas e sou da época em que "Homem não chora".
Mas que saudades, meu Deus!

2 comentários:

  1. Viajei no seu texto lindo e fiquei com os olhos marejados lembrando da minha infância nessa terra branca e linda que nunca sai dos nossos coraçoes saudosos.
    Um grande abraço!

    ResponderExcluir
  2. Lembrei que no final da década de 50 (sou de 1955) assisti escondido de minha mãe o filme o pequeno polegar aí em algum cinema de corumbá(não sei qual nem onde ficava). Quando me acharam levei a maior surra de minha mãe. Parece que perto do cinema havia uma loja (?). Hoje estou em bauru/sp.
    É bom ativar antigas e ótimas memorias.

    ResponderExcluir