Eram 6:00 horas da tarde. Não lembro a época mas devia ser inverno pois já estava escuro. Estava saindo do escritório da ema quando veio a notícia pelo rádio da fazenda. A filha de 3 anos do Temporal, empregado nosso dos mais antigos, tinha sido picada por uma cobra boca de sapo na fazenda S.Bento que ficava na estrada Parque do outro lado do Rio Paraguai. Sabíamos que com essa idade se não entrasse no soro em no máximo quatro horas não iria sobreviver. Avião já não dava mais para ir buscar. Carro eram duas horas e meia para ir e outro tanto para voltar. Na fazenda tinha uma toyota, mas o único motorista, seu Neco, não tinha carteira e só dirigia em estrada de "chão". O único jeito era ele ir até o morrinho, na travessia do Rio Paraguai, e eu encontrar com ele lá. Ele teria que percorrer 14 km de chão mais 40 km de asfalto, o que ele faria pela primeira vez na vida. Eu, saindo de Corumbá, tinha 75 km de asfalto até o ponto estimado do encontro, que seria na balsa para atravessar o Rio Paraguai.
Para não ir sozinho convidei papai, que se prontificou em ir comigo. Abasteci o carro, uma pajero do ano, peguei o velho e deitei cabelo. De noite, numa estrada de mão dupla, cheia de animais na pista, cheia de buracos, cada caminhão que cruzávamos ficávamos por 5 segundos completamente as cegas. Lá pelas tantas ele perguntou a quanto íamos e informei que o velocímetro era mentiroso, mas marcava 180, ao que ele respondeu:
- Acho bom, pois senão ao invés de salvar uma, vão morrer três! E deu risada, mas acho que de medo...
Na hora de embarcar na balsa ele falou:
- Puta merda e se depois dessa correria toda, esse cara embarca na balsa do outro lado e cruzamos no meio do rio...
Pior que ia acontecer isso mesmo, mas chamamos por rádio a outra balsa e o comandante sabia que tinha embarcado um carro com uma menininha picada de cobra. Aguardamos na nossa margem, fizemos o translado da menina, que já estava com a mão inchada igual de boneca e viramos a cara pra traz. Cento e oitenta de novo no velocímetro mentiroso e duas horas após a picada ela entrava no soro.
Quando conseguimos relaxar papai falou:
- Tô com o rabo zerado de tão fechado que ele ficou, mas nem Airton Senna faria tempo melhor. Valeu meu filho!
Falou isso com os olhos marejados de lágrimas.
Tadeu,
ResponderExcluirSou o Tucuxi, que morava com Beto em Piracicaba. quero lhe dar os parabéns pelo blog. Estou me deliciando com os causos aqui postados. Um grande abraço à todos vcs!!!