segunda-feira, 6 de junho de 2011

O início dos tempos

Sempre me pego pensando em quais fatos mais antigos eu tenho na memória. Fico sem saber o que eu realmente vi e o que se firmou por fotos ou narrativas de terceiros. Da casa que tínhamos na Mello Alves, em São Paulo, tenho uma lembrança muito nítida, mas não sei qual foi a última vez que estive lá e ninguém consegue me precisar essa data. Da babá, a última de que me lembro, contratada com o fim específico de cuidar de mim, foi a Rosinha. Lembro-me dela cantando Luar do Sertão para me fazer dormir e só isso não define a minha idade. Mas me lembro também dela me levando para tomar banho de macaquinho, quando eu subia nas suas costas, me agarrava no seu pescoço e fazia-a galopar pela escada do sobrado acima. Calculando o peso dela, era muito magrinha, e a velocidade que eu conseguia imprimir, dá para concluir que eu não podia pesar mais do que 10 kg. Como eu era muito magrinho também, calculo de 4 para 5 anos. Aí entro numa contradição, pois eu tinha uma serraria nos fundos de casa, e fazia cadeiras e mesas de caixote de frutas, com ela me ajudando, lógico. Não era tão inteligente assim para fazer isso com essa idade, e volto para a estaca zero.

Com papai, me lembro dele estacionado em frente da igreja matriz, esperando a missa acabar e pegar Mamãe. Eu ficava de pé no banco e com as mãos em seus ombros, enquanto ele lia jornal. Acho que não descíamos na igreja juntos com ela, pois eu ficava correndo e azucrinando a missa, mas essa conclusão já é minha atual. Lembro até de escutar a voz de mamãe cantando na missa e sobressaindo sobre as demais e papai identificando ela para mim. Como ficava de pé no banco, calculo de 4 a 5 anos, de novo. É incrível como isso me deixa nervoso. Não sei quando a minha vida começou realmente, com todos os registros em minha memória. Sinto como se me faltassem esses anos iniciais. É como você comprar um bolo com uma mordida desconhecida. Se eu pudesse achar que isso aconteceria, começaria esse blog mais cedo. A primeira história seria, "Comecei sentindo um tapa na bunda, que só parou quando chorei. Que merda será que já fiz".

Já na escola Domingos Sávio, me lembro do dia em que fui à aula com o meu primeiro relógio, novinho, sem saber ver as horas. O Roberto Costa Marques, que era bem mais velho, me vendo com o relógio perguntou as horas. Lembro da minha resposta, mostrando o relógio para ele falei: "Não sou seu empregado. Quer saber? Olhe aí que eu deixo.” Devia ter 5 para 6 anos para não saber olhar horas e ter esse tipo de resposta.

De outra época, mamãe foi com papai para São Paulo e ficamos, eu e o Tontonio, sozinhos em casa e para cuidar da gente ficou a minha prima Elisa. Ela era bem mais velha que a gente. Me lembro que ficava sozinho com ela enquanto Tontonio ia para a escola. Não via a hora dele chegar pois ela me dava medo o tempo todo. Ela só conseguia fazer eu ficar quieto ameaçando de chamar o Joãozinho do Saco pra me levar. Era um sujeito mal encarado que andava catando coisas na rua e carregava tudo em um saco nas costas. Ela me falava que estava cheio de crianças desobedientes e que se eu não a obedecesse ia chamar o Joãozinho para mim. Vivia atemorizado ou aterrorizado. Apesar da judiação, isso serviu para me ligar mais ainda ao meu irmão, que passou a ser meu salvador e quebrava o maior pau com ela toda vez que eu reclamava para ele. Talvez essa seja uma das lembranças mais antigas e não tão boa assim. Não posso dizer que tenho da Elisa a mesma saudade que da Rosinha, essa sim eu gostaria muito de reencontrar, mais não tenho a menor idéia de seu paradeiro e nem sei se está viva. Sei que tinha uma irmã gêmea que se chamava Tereza e um irmão que vendia picolé na rua e se chamava João. Se alguém achar a Rosinha para mim será bem gratificado. Prometo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário