segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Virginia Kevork Choulian

Dona Virginia faz parte daquele seleto grupo de pessoas que não queremos esquecer jamais, nem eu nem Beá. É a esposa do Choulian e uma das pessoas mais educadas que já conheci. Quando trabalhava na Mecânica Pesada e era o chefe de departamento de Engenharia, ela era a minha calculista número 1. Eu era seu chefe e o marido, o Choulian, era o meu chefe. Era uma situação muito peculiar, com muitos lances engraçados, como todas às vezes que eu queria dar um aumento salarial para ela e ele não autorizava, apesar de saber ser merecido. Era um parto e às vezes até ela falava que não queria. Devia ser ele perturbando. Mas aprendi muito com ela pois quando comecei a calcular equipamentos hidromecânicos, ela foi a minha professora. Quando tinha algum cálculo mais complicado, fazíamos juntos e me lembro, que nessas horas fumávamos demais, eu no Minister e ela no LS, foi a única pessoa que conheci que fumava essa marca, acho que era fabricado sob encomenda.
Ela era engenheira civil, tinha terminado o curso na Bulgária, mas não conseguiu pegar seu diploma. Foi na época que o comunismo tomou conta de seu país e vieram de qualquer jeito para o Brasil. Um dos meus primeiros projetos na área foi de uma comporta e por ocasião da fabricação descobriram que se construíssem como eu tinha projetado, teriam que prender um soldador dentro de cada elemento. Tinha um compartimento estanque e todas as soldas eram internas. Era ainda inexperiente e fui motivo de gozação da fábrica toda. Ela me consolou dizendo que só errava quem fazia e eu tinha que me acostumar a isso pois era novo e ainda faria muitas coisas e, conseqüentemente, várias besteiras. Arrumou o projeto para mim fazendo uma boca de visitas no compartimento estanque e resolveu tudo. Quando fui promovido para chefe, foi uma das pessoas que mais me incentivou.
O casal, além dessa relação de chefia cruzada, era nossos melhores amigos. Éramos estrangeiros de Corumbá, naquela cidade de Taubaté. A dona Angel, mãe do Choulian era uma excelente cozinheira e sempre que fazia alguma coisa especial, nos convidavam para comer com eles. Tinha uma massa folheada inesquecível. Foi em um desses jantares que tive meu controle emocional testado, eu e mais o resto do povo. Tínhamos um amigo em comum, solteiro aos 35 anos e arrumou uma namoradinha nova e a levou para nos apresentar, em um dos jantares da dona Angel. Sua principal característica era a seriedade. Ele era, antes de tudo, um cara sério. Nunca o vi, ou ouvi, dar uma gargalhada. Ele sorria. Era muito simpático, mas sério. A namorada, era compatível com sua seriedade, trintona e séria também, mas tinha uma mania muito engraçada, ela gostava de coçar a orelha dele. Era uma coçadinha carinhosa. Começava com uma esfregadinha no lóbulo, colocando-o entre o polegar e o indicador, assim como se estivesse contando dinheiro, e alternava para a parte de cima, quando com os outros três dedos ela fazia o contorno da parte superior da orelha, aquela onde a cartilagem era durinha. Ia se alternando e não parava. Bebia com uma mão e a outra na orelha do homem. Ele falava meio sem mexer a cabeça para não atrapalhar a coçada. Com o tempo aquilo foi avermelhando e o pessoal começou a perceber e já não podia um olhar para a cara do outro sem querer sorrir. Já tinha gente querendo sugerir que se alternasse as orelhas, pelos menos ficariam as duas da mesma cor. E a preocupação com a necrose? Será que se fosse o dia todo assim, não poderia vir a gangrenar? Com essas idéias passando pela cabeça de todos e àquela vontade de dar risadas sem ter motivos que justificassem pois a conversa era de coisa séria, foi ficando uma coisa acumulada e começaram as idas no banheiro. Acho que o nego ia para rir tudo que podia e voltava de olho inchado e torcendo para que o martírio tivesse acabado, mas chegando na sala via que estava tudo igual e nada havia mudado, nem mesmo o lado da orelha, talvez só a sua cor, mais vermelha.
Até hoje, quando vemos um casal, com um acarinhando a orelha do outro, já lembramos daquele jantar inesquecível e começamos a dar risadas.
Mas éramos una equipe e tanto. Se comparado a seleção brasileira, éramos a de 70.
Bons tempos.

Um comentário:

  1. Olá Tadeu, estamos aqui curtindo um friozinho, comendo uma raclet e tomando um vinho; e nos lembramos de você e da Beá. Comentamos sobre o seu blog e suas história divertidas! A Diana nos trouxe o NB para relermos algumas delas. Rimos muito e sentimos muitas saudades. Um abraço carinhoso dos amigos Carlos, Maria Tereza, Diana, Michele, Nonô, Anie, Kiki e Chu!

    PS: e uma coçadinha na orelha!!!!!! HAHAHAHAHAHAHA

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