segunda-feira, 16 de julho de 2012

Nhogonça


Nós temos muitas expressões e palavras regionais, umas vindo do castelhano devido ao fato de estarmos na fronteira com a Bolívia, e outras de difícil definição da sua origem. "Vôte", para algo muito ruim, e "vixe", para algo inacreditável, são de origem espanhola e motivo de muita gozação quando usadas fora daqui. Sempre ouvi e falei que coisa muito antiga era da época do "Nhogonça", sem nem desconfiar do que se tratava. Outro dia encontrei a dona Neta, uma senhora por demais simpática, cliente da nossa Casa de Carne da Delamare, e fui elogiar a sua disposição. Quando, indiscretamente (acho que é uma das minhas características), perguntei a sua idade, ela me falou que passava dos 80. Vi que a falta de precisão era para ocultar parte da verdade. Para ser gentil – e realmente ele é muito conservada – dei o famoso "não acredito!". Ela, muito espirituosa, me declamou uns versos, que fiz questão de tomar nota, e que transcrevo aqui:

O tempo passa depressa
Sem a gente persentí
Quando assusta já tá véio
Sem enxergá, nem ouví

Tropicando a cada passo
Num perigo de caí
Aí chega a veíce
E a gente começa a mentí.

– Muito legal, dona Neta. Não conhecia. Quem é o poeta?

– Nhogonça.

Na hora, percebi que Nhogonça era a abreviação de Senhor Gonçalves, alguém muito velho. Ela não soube me dizer quem era com exatidão, mas falou que era ligado ao pessoal dos Barros. Saí atrás e quem me esclareceu foi o Emilio de Barros. Ele era filho de Nhonho Fancho, apelido de Francisco Leite de Barros e Nhanha Antônia, Ana Antonia de Arruda Leite, que vêm a ser os bisavós do meu sogro, Antonio Pedro de Barros. O interessante é que o Nho Gonça tinha uma irmã, Custodia, e desconfiam que era ela a escritora e usava o apelido do irmão como pseudônimo.
Quem diria que eu descobriria um escritor desconhecido, da época do Nhogonça.
Mas essa foi fácil.

Um comentário:

  1. Tadeu, Nho Gonça era irmão caçula de Vovó Chechê, esposa do Velho Nheco. Por ser meio, aliás totalmente, "tumbá" a Nhá Dita, sua irmã mais velha e solteirona criava versinhos para que ele desenvolvesse suas obrigações. Dessa forma são inumeros versos repetidos e transmitidos na família. Existem versos para escovar dente, para ir no banheiro e assim por diante.
    Parabéns pelo seu blog!
    Grande abraço
    Luiz Otavio Carneiro

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