segunda-feira, 13 de agosto de 2012

A Brasília verde.


Meu escritório da distribuidora de carnes Sabor 10 está em um prédio construído por Vovô Marinho em 1909. Ele comprou um terreno grande na rua 7 de setembro entre a Delamare e a 13 de junho, no centro da cidade, e construiu três casas, uma que foi a sua residência pela vida toda, e outras duas, para aluguel. Hoje está na parte histórica e tombada da cidade. Ficaram para tia Dirce e, com a ida de Emilinha, sua filha que morava lá, para o Rio, resolveram vender e não queriam que fosse para mãos de estranhos – eu e meu irmão acabamos comprando. Transformei em quatro e já restauramos três delas. As outras duas estão alugadas, uma para a Sandra, fisioterapeuta e que tem uma academia de Pilates, e a outra para a Paty, minha nora, que tem uma empresa de recursos humanos. Ficou um lugar muito legal.
A peculiaridade está na rua que tem o grade muito acentuado. O estacionamento é permitido e na diagonal. Nossa vizinha de frente é uma senhora idosa e tem uma Brasília igual. Não sei pela idade de quem, mas toda vez que vamos estacionar, a preocupação é ficar longe e fora do alcance das duas. Algumas semanas atrás, na hora da minha aula de Pilates, veio a notícia: a velha da Brasília morreu. Ficamos tristes, eu e a Sandra, mas tudo tem o seu lado bom, até na morte. Não corríamos mais o risco de ser abalroados. Já tinha até esquecido do fato, tinha acabado de estacionar meu carro e, na saída dele, percebo alguém vindo devagarinho mas com a rotação no máximo, para estacionar ao meu lado. Quando vi que era a Brasília verde, procurei rapidamente o motorista e lá estava ela, vivinha da silva. Além da rua ter uma caída muito grande para a guia, esta última é muito alta. Do jeito que ela vinha, devagarinho e acelerando, achei que ela queria dar ré e não tinha percebido que a marcha não tinha entrado. Quando ela estava para bater na guia, num ato de puro reflexo, coloquei as duas mãos sobre o capô do carro e forcei para ver se conseguia pará-lo. Assim que encostei a mão, ela deu uma puta freada e já gritou comigo:
– O que o senhor está fazendo? – O carro continuava acelerado.
– Onde a senhora vai? Não tá conseguindo engatar a ré – Consegui responder, com a maior gentileza possível.
– Estacionar aí, ué! Engatar ré para quê? – Já percebi uma certa neurastenia na velha. Barbeira e neurastênica.
– E precisa acelerar desse jeito? A senhora está para bater no meio-fio. Se não bater agora, vai bater na saída.
Nem me agradeceu, parou ali mesmo e foi conferir para ver se eu não estava exagerando. Como estava muito perto mesmo, olhou para mim com um sorriso maroto e, enquanto eu esperava pelas suas desculpas, ela falou:
– Mania que vocês homens têm de achar que toda mulher é barbeira. Tá muito bem estacionado.
Dei um "boa tarde" e quase um "bem-vinda ao mundo dos vivos" e entrei. Esperei alguns segundos e voltei para tirar o meu carro do lado do dela. Estacionei a uns seis metros de distância e com um framboaiam entre eles. Por via das dúvidas.

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